sexta-feira, 6 de novembro de 2015

Pensando a escravidão na moda, os preços superbaixos das fast-fashion e o (seu) consumo.



Ontem eu vi um documentário que trouxe à tona muito mais do que ele dizia. Sob o nome "Escravidão na moda", o filme exibido no GNT.DOC trata de um projeto no qual três jovens noruegueses (média de 20 anos) teriam que passar alguns dias no Camboja vivendo como trabalhadores da indústria têxtil. A princípio eles não sabiam o que fariam lá.

Para contextualizar, o Camboja é um dos maiores centros têxteis de baixo custo no mundo. Produz para marcas como H&M e Mango. 

Um trabalhador cambojano ganha US$130 por mês e só de aluguel por um quarto sem cama e um banheiro que não é mais do que um buraco no chão mais luz e água esse trabalhador pagará US$50. A trabalhadora que participou do projeto tem 19 anos e contou que gasta com roupas pra ela de US$1 a US$2 a cada seis meses. Ela compra no mercado da cidade. Não pense em um mercado grande e vistoso, mas sim em um lugar pobre, sujo, com mercadorias usadas e muita coisa de pouca qualidade. 

Os jovens escolhidos eram grandes consumidores de moda: a blogueira mais importante da Noruega, um rapaz que compra mais do que pode usar e uma garota que mistura roupa de moda com roupa vintage.

No primeiro contato, tudo lhes pareceu mais leve do que realmente era. Tiveram a sensação de que mesmo com uma vida difícil, esses trabalhadores eram felizes, afinal de contas, eles já nasceram nessa vida, não é?

A surpresa veio após a visita a uma trabalhadora, entendendo como era a vida dela e descobrindo que teriam que viver como ela. Dormir na sua casa, acordar às 5h30 e trabalhar de 8h a 12h / dia sem parar. A única pausa é para o almoço. Come-se sentado no chão, uma comida que já está a algum tempo exposta ao tempo e às moscas. Os participantes tiveram nojo de tocar na comida, mas lhes pareceu uma ofensa não comer com os outros. Uma delas comentou que havia larvas no peixe.

Depois de um dia de trabalho, duas coisas foram bem marcantes: o fato de realizar uma única função (uma única costura, sempre a mesma, na roupa) e também ganhar somente US$3 por essas 12h de trabalho no calor escaldante, sem nenhum conforto.

Existem manifestações no Camboja pedindo que o salário aumente para US$160 para que os trabalhadores possam pelo menos se alimentar corretamente.

Após todas as provas, vemos uma mudança significativa de pensamento nos três jovens, principalmente após a conversa com a jovem cambojana que os acolheu: descobriram que ela queria ser médica, mas teve que deixar o colégio porque sua família não podia mantê-la estudando. A mãe morreu de fome quando ela ainda era um bebê e desde então ela e os irmãos foram criados pelo pai. Os trabalhadores não têm direitos, então consequentemente não têm descanso nem dinheiro para ter um pouco mais de qualidade de vida.

Para ver o documentário com legendas, clique aqui.

Pensando em tudo isso, chegamos a várias questões:

- a roupa super barata que compramos lá fora se deve unicamente à escravidão desses trabalhadores. Como as grandes fast-fashion pagam uma ninharia para essas pessoas, fica fácil cobrar 10 euros por uma peça. A gente reclama muito dos preços das roupas no Brasil, mas nunca questionamos o por quê de serem tão baratas na Europa.

- vem crescendo no mundo o fenômeno bespoke. Trata-se de ter uma peça ou acessório feito especialmente para você. Pode ser uma roupa, um sapato, uma joia. A questão é que cada elemento é feito a mão, com cuidado e totalmente pensado para ficar perfeito no seu corpo. Isso tem um preço, mas faz com que a peça seja única, o contrário do fast-fashion.

- toda essa conversa nos faz pensar também no consumo. Você já parou para pensar quanto gasta em roupas e acessórios por mês? Quando vai comprar algo, você pensa se realmente precisa daquilo ou se compra pelo hábito de comprar? Você tem peças esquecidas com etiqueta no seu guarda-roupa? Você usa suas peças com frequência, ou usa sempre as mesmas e deixa um monte de coisas esquecidas no fundo do armário? 

- você sabia que o dono da Zara é hoje o homem mais rico do mundo? Ele já fez parte de um escândalo de escravidão como o do vídeo. Agora eu pergunto: se ele é tão rico, dar condição de trabalho e vida para esses trabalhadores o faria menos rico?

Da próxima vez em que for comprar uma roupa em uma fast-fashion pense que o seu troco é mais do que um trabalhador cambojano ganha por 12h de trabalho. Isso tudo põe o consumo em perspectiva.


Para pensar hoje e na próxima ida ao shopping.

Até mais.

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