Adoniran Barbosa (06.08.1910 - 23.11.1982)
Há exatamente 100 anos atrás nascia João Rubinato, um filho de imigrantes italianos no interior de São Paulo. João largou os estudos ainda menino e foi trabalhar cedo prá ajudar a família. Seus pais até alteraram sua certidão de nascimento prá que ele pudesse pegar no batente mais cedo. Foi tecelão, balconista, pintor de paredes e até garçom.
No começo dos anos 30 começou a frequentar os programas de calouros da Rádio Cruzeiro do Sul, em São Paulo e tanto tentou que acabou ganhando um concurso em 1933, cantando a música "Filosofia" de Noel Rosa. Foi assim que ele começou sua carreira de cantor e logo de compositor.
No meio desse sucesso alcançado tinha um problema. João Rubinato não era nome de sambista! Foi aí que ele se recriou. Pegou emprestado o Adoniran de um amigo e o Barbosa do sambista Luiz Barbosa e assim surgiu um dos nomes mais queridos do samba: Adoniran Barbosa.
Com a nova alcunha, Adoniran cantou a vida de gente muito simples. Situações do dia a dia ganharam ritmo e ficaram prá sempre na memória. Quem não ficou bravo com o Arnesto que saiu e não esperou a galera prá festa sem nem deixar um bilhete dizendo que não deu prá esperar (assinado em x porque Arnesto não sabia escrever)? Ou não ficou aflito de ver que o trem das 11 já estava prá chegar? Ou mesmo se compadeceu da dor pela morte de Iracema. Ah, saudosa maloca!
Adoniran, com suas letras extremamente simples e cantadas com o linguajar do povo, conquistou muitos corações, fez muita gente rir e chorar. Aliás, a linguagem usada é bem interessante: os erros de português são recorrentes. Adoniran dizia que "pra escrevê uma boa letra de samba a gente tem que sê em primeiro lugá anarfabeto".
Adoniran gravou três discos e faleceu em novembro de 1982. Morreu quase sozinho, tendo somente a companhia de sua mulher e sua cunhada. Morreu pobre e quase esquecido e essa é uma coisa que me entristece. As pessoas que realmente criam a música, entre outras artes, muitas vezes são apagadas da memória, como se não tivessem dado uma grande contribuição à nossa cultura. Me dói pensar que com Adoniran, assim como com muitos outros foi assim.
Paciência, Adoniran, paciência!
Uma de suas frases à respeito da cidade que amou e cantou dizia "Até a década de 60, São Paulo ainda existia, depois procurei mas não achei São Paulo. O Brás, cadê o Brás? E o Bexiga, cadê? Mandaram-me procurar a Sé. Não achei. Só vejo carros e cimento armado." Acho que ele se foi com a dúvida.
Em homenagem à grande beleza de suas músicas e sua vida, deixo um vídeo de 1978 da música Iracema (minha música preferida) com Adoniran Barbosa e Elis Regina. A letra segue abaixo. Ao fim do vídeo Elis canta "Saudosa Maloca" e convida Adoniran para ir à uma boate ver o show de Rita Lee. Imperdível!
Iracema, eu nunca mais eu te vi
Iracema meu grande amor foi embora
Chorei, eu chorei de dor porqueIracema, meu grande amor foi você
Iracema, eu sempre dizia
Cuidado ao travessar essas ruas
Eu falava, mas você não me escutava não
Iracema você travessou contra mão
E hoje ela vive lá no céu
E ela vive bem juntinho de nosso Senhor
De lembranças guardo somente suas meias e seus sapatos
Iracema, eu perdi o seu retrato.
- Iracema, fartavam vinte dias pra o nosso casamento
Que nóis ia se casar
Você atravessou a São JoãoVeio um carro, te pega e te pincha no chão
Você foi para Assistência, Iracema
O chofer não teve curpa, IracemaPaciência, Iracema, paciência
E hoje ela vive lá no céu
E ela vive bem juntinho de nosso Senhor
De lembranças guardo somente suas meias e seus sapatos
Iracema, eu perdi o seu retrato
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